ARTE
A arte é uma representação passiva da natureza, criada pelo homem.
É uma representação porque não existe nada de real na arte que não tenha existido antes na natureza. Qualquer obra de arte é apenas uma composição de matéria, com aspectos curiosos, admiráveis, extraordinários e excêntricos, umas vezes belos, outras vezes hediondos. É uma composição de matéria passiva porque a arte só se identifica em obras criadas. Uma obra de arte só é assim considerada após a sua conclusão, e uma vez completa, a mesma não volta a ser modificada. Do mesmo modo, um artista — o criador das obras de arte — só pode ser considerado artista após provas dadas em obras feitas. Ninguém é artista se todas as obras ficam por concluir.
A arte é uma representação da natureza porque a matéria da qual se cria a arte é a mesma por que é formada a natureza. A natureza auto modela-se desde as formas mais simples às mais extraordinárias devido a forças ainda nem todas conhecidas pelo homem, criando composições maravilhosas, que são fruto da casualidade entre as partes por que é composta — uma ilha paradisíaca pode ter sido formada por um vulcão, ou um belo pôr-do-sol pode ser fruto do reflexo do sol na água. Da mesma forma o artista modela a matéria, diferenciando-se no facto de que umas vezes pensa e planeja a obra a realizar e outras vezes cria sem pensar.
A arte é um produto final, um resultado. É uma realidade observável, e o observador é o próprio homem. Assim, a arte é um produto de e para o homem. Só o homem a cria e só o homem a contempla.
A arte em si, como produto criado, é uma coisa inerte, sem vida, mas o seu significado para o homem é de enorme valor. Pela arte se revê o homem, no que este possui de simbólico. Pela arte se estuda o homem, se reconhecem as suas capacidades criativas e sensibilidades, e principalmente se reconhece todo o seu mundo abstracto de cultura e espiritualidade.
A arte é um prazer, e como tal, só surge após outras necessidades humanas se encontrarem satisfeitas. Como todos os prazeres do homem, a arte só é sentida ao “sair” e ao “entrar” no seu corpo. Por um lado, a arte significa muito para quem a cria porque sente uma exteriorização do seu espírito, em sons, imagens, ideias, ou sob qualquer outra forma de expressão, que conduzem a uma auto-realização pessoal. Por outro lado, para quem a recebe através dos sentidos, só a recebe porque gosta — caso contrário evitava-a — e assim sente prazer e bem-estar, ou deleite, ao contemplar uma obra criada por outro, mas que lhe diz algo, e se lhe diz algo é porque o leva ao encontro de si próprio, do seu espírito, e ao encontro dos outros e da vida.
A arte é representação da natureza porque o homem só modela a matéria existente na natureza. Por outro lado, também o homem só observa na natureza aquilo que é observável na mesma. A evolução existente na arte só é possível devido à evolução existente na técnica. A técnica cria constantemente novos produtos que são usados pelos artistas, mas a arte em si não evolui, porque está limitada à natureza. A arte é como que uma falsificação da natureza. Todas as cores de todas as pinturas, todos os materiais de todas as esculturas, e todos os sons de todas as músicas, existem na natureza antes de serem usados na arte. Os sentidos humanos têm limites naturais que a ciência já mediu (por exemplo: só se ouvem sons entre dezasseis e vinte mil hertz), e como a arte só é observável através dos sentidos, então tudo o que o homem criar que possa ser observado, existe entre parâmetros iguais a tudo o que pode ser observado na natureza. A arte é uma recriação da natureza feita pelo homem.
Mas como a arte é um produto exclusivo do homem, está natural e intimamente ligada a ele por diversos aspectos. Por um lado, a arte, como actividade lúdica, surge só após a satisfação das necessidades elementares de sobrevivência. Depois, acompanha toda a evolução humana. Nasce fortemente influenciada pela religião e por outras magias, acompanha as tendências de todas as épocas quanto a valores religiosos, sociais, políticos, comerciais e outros, até que acaba por existir como um fim em si. A arte pela arte.
De uma pessoa com capacidades criativas superiores, o artista passou a ser uma pessoa que estudou e aprendeu a arte, para a produzir de uma forma planeada, estando rotulado em determinado estilo, moda ou tendência, e a sua obra passou de preciosidade artística a objecto de valor comercial.
A evolução do homem permitiu que fosse criada uma nova e importante forma de arte. Da representação da natureza passou-se à representação do próprio homem. Da expressão plástica, da pintura e da música, passou-se à expressão literária. Primeiro a linguagem era usada para fins práticos, mas com a evolução passou a ser usada para transmitir histórias reais e lendas, em cantigas, em oratórias e em peças de teatro, até que a própria linguagem passou a ser uma forma de arte de representação. Primeiro a poesia e depois a prosa romântica, transformaram a linguagem numa das principais formas de expressão dos valores espirituais, sentimentais, morais e humanos. A literatura romântica e ficcionista — o escrever pelo prazer de escrever, ou a arte de trabalhar as palavras — permitiu ao homem a criação de ideias e histórias complexas, e a possibilidade de as transmitir embrenhadas no mais enredado e imaginário ambiente.
O cinema e televisão possibilitaram a composição de diversas formas de arte. Um bom filme é uma obra de arte, que pode ser realizado em belos cenários, pintados ou construídos — outras formas de arte —, pode ter um bom enredo — outra forma de arte —, ser bem interpretado e ter uma boa banda sonora. Pintura, escultura, literatura, teatro, música e quiçá poesia, enfim, todas as formas de arte reunidas numa só.
A arte nasce na imaginação. Os seus limites são os limites da representação material. A diversidade de possibilidades de criações artísticas é interminável, mas caracteriza-se em três aspectos: ou representa a realidade existente; ou representa a imaginação de uma realidade — virtual — e esta representação confunde-se muitas vezes com a realidade concreta; ou representa o abstraccionismo, aquilo que não tem qualquer conotação com a realidade, que se encontra muito presente na arte moderna, em obras com tendências surrealistas, e que são criadas de uma forma muito próxima da natureza, em que, subitamente deparamos com algo que nos cativa, surpreende, e que achamos perfeito, mas que ninguém consegue explicar como foi realizado.